A INTENSIFICAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE: ESCOLA NÃO É UMA EMPRESA
Cartaz do Evento que aconteceu em 23 de maio de 2016 no Auditório do Colégio Politécnico da UFSM promovido pelo Sindicado Nacional dos Docentes que tratava do estresse da obrigação produtiva.
Disponível em: http://sedufsm.org.br/inc/fotoresize.php?imagem=http://sedufsm.org.br/midia/2016/05/F11-6153.jpg&tmh=600
Infelizmente a sociedade
capitalista massificou a escoa de tal forma que configurou o ensino como um
processo taylorista-fordista em que o
professor fornece a mão de obra necessária para ofertar um tipo de “serviço”.
Marx, 1978; já afirmava que o professor oferece um tipo de “serviço” não
material que pelo simples fato de ser remunerado, a relação “serviço”, é muitas
vezes entendida como expressão de compra e venda de uma força de trabalho na
produção de mercadorias. Uma vez que o trabalho docente não produz um produto
fruto de um objeto material, mas ele cede seu tempo a instituições que
determinam as condições do trabalho, controlando, precarizando e
intensificando, por tanto, mais explorado. KUENZER E CALDAS, 2009; afirmam que
após a privatização da escola, por mais que não exista a produção de um
produto, a mercantilização do ensino é o viés da tendência desse século que
está destruindo a razão de ser do professor, da sua liberdade de como trabalhar
e a possibilidade de criar e inovar seu método de ensino. TORGAL, 2008, é profético
no seu artigo sobre A Escola e o Fordismo quando afirma que a escola foi
pervertida pela imposição, por parte do Ministério da Educação, de um sistema
burocrático kafkiano que visa obrigar os professores a fabricarem um sucesso
educativo ilusório. Em outras palavras, a escola está sendo transformada em
empresa e sua característica principal, formar para a cidadania, está sendo
cada vez mais suprimida pela força que o “direito” de quem paga pelo “serviço”
possui.
É fato que após o séc. XX as escolas
tiveram que reformular suas estratégias, sua “clientela” para oferecer um
“serviço” diferencial que em nenhum momento possui um viés pedagógico de formação.
As escolas estão focadas no lucro na condição do status e dos rankings que
medem a eficácia e a qualidade do ensino perdendo a característica de ser
escola. Claro que sabemos que o trabalho exige empenho, condições, normas e remuneração,
mas precisamos entender que a escola é uma escola e a configuração de ser uma
empresa é uma relação que existe entre seus administrativos, porém da porta
para dentro e as relações professor-aluno-escola não pode ser tratada de tal
forma. Precisamos resistir e fazer entender que escola sempre será uma escola e
“serviço” educacional não pode ser equiparado a uma linha de produção da qual
ao final do processo teremos um novo produto a ser lançado no mercado.
Disponíveis em:
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZSkpmnaUxlbcl5wfnhE8-nRnstsnMMwraQVFMVRxFG8l5yuRSZKja5opIgwur6w9dLu1P29531bGKFtuGKTx1CS3Qp__q3qcEE8arItWll3QycftE-k6DN2rpUQPpEaXOcciDcfmFrXo/s1600/Ford.jpg
https://colegiofriburgosp.files.wordpress.com/2013/10/gja_9519.jpg
Essas
imagens são meramente ilustrativas e nada declaram com o exposto do artigo
A seguir um vídeo do comediante Gregório
Duvivier que faz uma sátira, e grandes ponderações, sobre uma famosa rede de
ensino que infelizmente se popularizou no Brasil carregando consigo a visão de
“mercado educacional”:
O ideal seria uma instituição que
pudesse compreender que lucro e condições de trabalho são relações pertinentes
ao processo não o meio de ser. Deveria... 

Em contra partida o professor se
encontra numa artilharia pesada entre qual escola em pleno séc. XXI não pensa
na condição de lucro, que valoriza seu corpo docente, que institui valores e
que pensa no aprendizado como norteador da sua existência, sim, utopia! Pois o
professorado precisa resistir às demandas, horas extras ‘extra-casa’ não
remuneradas, salários desumanos, condições e assédio moral que o colocam num
limbo entre continuar e desistir da sua carreira. Boas escolas existem,
condições de trabalho e atuação também, mas até o encontro dessa ‘Meca’ educacional
o professor já sofreu com o desprestígio do seu trabalho, portanto, sendo um
trabalhador não material (que não produz um produto físico, mas valores) e superexplorado,
confere-lhe condições de desgaste e sofrimento.
É normal relatos e histórias de
professores que abandonaram a docência provocados por várias situações e condições
que sabemos quais levam a tal processo, mas nos dias de hoje seja pela nova
configuração da família, novo perfil de aluno, cenário atual social, o
professor não consegue lidar com N situações adversas que levam a desgaste
emocional e tornando-o vulnerável as doenças ocupacionais.
CODO, 2009 em uma pesquisa da
Confederação dos Trabalhadores em Educação (CNTE) afirma a condição das
limitações impostas pelo trabalho do professor e as limitações sociais:
Para CODO a síndrome de Burnout pode ser entendida como:
A dor de um profissional encalacrado entre o que pode fazer e o que efetivamente consegue fazer, entre o céu de possibilidades e o inferno dos limites estruturais, entre a vitória e a frustração; é a síndrome de um trabalho que voltou a ser trabalho, mas que ainda não deixou de ser mercadoria.
A síndrome é produto do estresse laboral crônico, uma espécie de resposta a não solução dos problemas, causando sofrimento ao indivíduo.
A visão do autor é a concepção
que temos até aqui, de que o trabalho docente, aquele prazeroso, qualificador,
transformador, realizador vem se deteriorando com o processo capitalista porque
por ser uma profissão não material, exige-se muito, sem limites não se
preocupando com as condições e nem com a saúde do profissional. Sendo mais
assertivo, o trabalhador braçal que constrói uma casa tem alta consideração em
face da produção do objeto que o professor que “nada produz” de substancial ou
tátil para ser dito, “nossa, olha aquilo que o fulano fez! Esse tem que receber
mais porque construiu aquilo”.
Vale destacar o quanto o
professor é metralhado por algumas instituições (as particulares escrativistas
principalmente) sobre os índices de qualidade do ensino como o IDEB (Índice que
mede a qualidade da educação brasileira) já que as públicas no Estado de Minas
Gerais, por exemplo, possui outro índice que é o PROEB - Programa de Avaliação
da Rede Pública de Educação Básica - (de forma mais humana sem tanta pressão
psicológica nos resultados) que tentam mostrar o avanço e o retrocesso que o
conteúdo teve em anos anteriores e onde precisa melhorar.
§Obs: nem todas as
escolas sabem de fato dizer em qual parte realmente do conteúdo está a quem e
em qual parte foi satisfatória para elevar esse índice. Por exemplo, qual
conteúdo em matemática os alunos conseguiram aprender efetivamente para elevar
o índice?Foi em função de primeiro grau ou interpretação coesa de gráficos ou
tabelas? §
De
certa forma esses índices vieram para mostrar onde focar mais no ensino e onde
precisa manter o nível, mas a sociedade capetalista capitalista insiste
em usar uma espécie de fita métrica diabólica que fez com que estes índices
tornassem meios publicitários onde fizeram deles um ranking da melhor e pior
escola ou da melhor e pior disciplina colocando o profissional em voga e muitas
vezes diante de um júri pedagógico que fatalmente condena o trabalho do
docente. É certo que esses índices como do ens. público é valido para mostrar
os erros e acertos do conteúdo se usado de forma mais humana não focado no ranking, porém.... infelizmente... muitas
escolas utilizam para fins publicitários ou para o mal mesmo, se é que você entendeu
assim.
Esses apontamentos até aqui são
necessários para evidenciar que a pressão social e a exigência administrativa
sobre o trabalho do professor é gigantesca e vai muito mais além do velho
jargão popular “você só dá aulas?”,
pois como se pode perceber o trabalho docente e a intensificação dele começa muitas
das vezes as7h da manhã e para só às 3h da manhã. O trabalho docente é
extraclasse e extrassocial e muitos não conseguem fazer a gestão do tempo de
serviço porque a produção do trabalho de um professor é algo imaterial o que
dificulta a sua gestão em alguns casos. Muitas pessoas acreditam que o trabalho
do docente só funciona com o aluno dentro da sala de aula e na verdade o aluno
é apenas uma parte de todo o processo.
Disponível em: http://marcohailer.blog.uol.com.br/images/IDEB.jpg
Trabalho Docente x Trabalho
Decente
Pela sua própria razão de existir
os processos educacionais deveriam ter um caráter mais inovador que pudesse
otimizar o tempo e render outras situações. Entretanto essa ideia não prospera,
porque diante dessas inovações são impostos determinados requisitos
motivacionais e psicológicos relativos a capacidade de aceitação, motivação e
acomodação dos indivíduos em relação as mudanças dos processos de trabalho.
Isso não quer dizer que haja uma resistência com as mudanças tecnológicas que
estão inseridas também no campo educacional, mas sim a luta pela incorporação
desses métodos que forçam a busca por novas concepções e soluções pedagógicas
para necessidades e problemas que a escola enfrenta. Ou seja, a inovação tecnológica
obrigou ao professor a adquirir habilidades de operar essas máquinas e delas
criar estratégias pedagógicas que consigam inovar seu modo de ensinar. Em
contra mão a esta via vem o principal problema que é a falta de estrutura de
operação das escolas. Muitas vezes escolas sem equipamentos, sem condições
físicas de trabalho e salas abarrotadas.
O trabalho docente vive um extremo de céu e inferno onde escolas totalmente
digitalizadas coexistem com escolas na era do cuspe e giz.
Quase pareado com este processo
que facilita ou mata a atuação do trabalho docente existe outro limbo carnal na
prática do professor onde percebemos como eles têm sido levados a assumir
papéis que exigem cada vez mais, além da sua formação acadêmica, na sua grande
maioria, funções de agente público, assistente social, psicólogo, enfermeiro, paramédico,
entre outras; que contribuem para a perda da identidade profissional, do que da
constatação que ensinar às vezes não é tão importante. A era da sociedade dos
serviços, sejam eles educacionais, sociais ou assistenciais; tornaram os
profissionais da educação mais como gestores de processos e de pessoas do que propriamente
como professores ou educadores. O contra choque contra cheque passou a
ser uma espécie de documento escrito em egípcio antigo que ninguém entende nada cheio de gratificações e
penduricalhos que não são incorporados realmente como salário base. Sem mencionar
que muitas escolas passam longe de reconhecer a titulação que o profissional
possui e se estão dispostas a pagarem por ela, pois cobram formação e competência
do professor, mas não querem arcar com o valor real que eles assim deveriam
merecer.
Todos os aspectos aqui levantados
são necessários para defender que o trabalho docente nada tem haver com a real situação
de vida e práxis do professor. É uma dicotomia mortífera que o professor terá
que conviver nos dias de hoje, onde ele clama por melhores condições de
trabalho e não é bem remunerado ou tem ótimas condições de trabalho e é bem
remunerado, mas adoece com a intensificação do trabalho dele.
FIDALGO e FIDALGO, 2009, concretizam
de forma pontual essa realidade que o tão sonhado apogeu docente sofre:
É nesse quadro que novas formas e instrumentos de trabalho invadem as casas dos professores, trabalhadores das 24h do dia, e criam uma moral cibernética na qual os relacionamentos tornam-se quase unilaterais e os diálogos transforma-se em monólogos ou, não raras vezes, são substituídos pelas rápidas chamadas no celular do outro, seja ele ou ela, pai, mãe ou filho, marido ou mulher, colega de quarto, apenas um conhecido com o qual se dividem as responsabilidades de manter uma casa, ou melhor, um lugar para habitar.
Disponível em: http://portal.andes.org.br/imprensa/noticias/imp-ult-297696676.jpg
Não é de se negar que
tecnologias, formação continuada (e plena), salário digno sejam condições
mínimas para que o professor possa conseguir realizar um trabalho digno na sua
condição de profissional da educação. É inegável que alguns instrumentos
existem para nos retirar da zona de conforto se queremos uma mudança na nossa
práxis educacional, mas outras que destroem o trabalho docente e vinculam a uma
péssima condição de trabalho nos impeçam de alcançar o real sentido de ensinar,
educar, formar sujeitos mais críticos... De ser professor. Esse post poderia
ser megalomático e ainda não seria suficiente para expressar e refletirmos
sobre como o trabalho do professor está sofrendo e vai sofrer ainda mais com a
nova configuração mercantilista que a sociedade atravessa. Nesse mundo de download, cloud in e 24h de trabalho intensificado nos resta apenas analisar se
devemos manter aquilo que defendemos enquanto sujeitos éticos de princípios ou
se devemos nos render a essa tendência de produzirmos números perfeitos para os
relatórios de avaliações produtivas do mercado.
"Espelho espelho meu, existe
um docente mais braçal do que eu?"1
1Entende-se como braçal o docente que tem jornada quádrupla de trabalho e
muitas das vezes sobre um regime capitalista e opressor.
Forte abraço, até o próximo post! 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CALDAS, Andréa do Rocio. Desistência
e resistência no trabalho docente: um estudo das professoras e professores do
ensino fundamental da Rede Municipal de Educação de Curitiba. Educ.
rev., Curitiba , n. 32, p. 261-262, 2008 .
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40602008000200019&lng=en&nrm=iso>.
Acesso em: 29 out. 2018.
CODO, W. et al. (orgs)(1999). Educação: Carinho e trabalho. Burnout, a síndrome da desistência de
educador, que pode levar à falência da educação. Petrópolis: Vozes.
Brasília: Unb/Psicologia do Trabalho.
FIDALGO, F. Trabalho e
carreira Docente: proposições teórico metodológicas para o estudo de processos
de proletarização e profissionalização dos professores.
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