AVALIAR PRA QUÊ?


Imagem Ilustrativa. Fonte: Internet


 Nos últimos 500 anos da existência da sociedade ocidental a seletividade está presente no nosso modo de vida. A sociedade é seletiva, somos seletivos ao comprar algo, seletivos ao escolher nossos parceiros sexuais ou comerciais.

Esse modo seletivo de escolher o melhor e deixar para escanteio aquilo que não é prazeroso, nós incorporamos no modo de ser da escola. Os modos de ser de agir da sociedade foram incorporados nos métodos seletivos da avaliação formal escolar desde então. Após o século XVI a pergunta que pairava era como seria realizado um modo que pudesse verificar a aprendizagem de muitos aprendizes? Os mesmos métodos que eram aplicados para seleção de soldados, de alguns profissionais, para entrevistas de emprego entre outros foram incorporados pela escola. Ou seja, aquele que era aprovado permanecia aquele que não aprendia era retido. Esse modelo de avaliação é linear, padronizado, cartesiano e não leva em consideração uma série de aspectos que hoje devemos levar em conta. Durou do séc. XVII até o séc. XX. Aí você se pergunta, qual é então a função da avaliação?

A função de uma avaliação é garantir o sucesso. Entenda que a avaliação é um processo que visa garantir sempre a melhor qualificação ou a melhor aptidão que um sujeito possui. Grandes filósofos e estudiosos do assunto (Cipriano Luckesi e Jussara Hoffman) irão afirmar que a avaliação visa buscar resultados satisfatórios no processo.

Resgatando rapidamente alguns contextos históricos da avaliação na década de 60 o modelo era focado na heterogenia do aprendizado. Todo mundo sabia a mesma coisa na ponta da língua. O ensino era cartesiano e ostentava bandeiras com lemas da elitizada escola da disciplina, austeridade, honra e excelência. Escola que, contudo, respondia, favoravelmente, à sua clientela, seleta, oriunda de classes abastadas, dominantes, aspirantes ao ingresso nas universidades. Na década de 70, podemos dizer que ocorreu a morte da educação rígida e disciplinada, pois surge o Tecnicismo do ensino profissional e a aproximação de uma escola que abraçava um grande contingente populacional urbano. A visão cartesiana, inspirada, por longas décadas, na filosofia da racionalidade do francês René Descartes, século XVII, era tida, para a situação, como linear, maciçamente repressora, passando sobre a individualidade das pessoas. Chegada à década de 80 a escola compreendeu como fundamental papel olhar para dentro do aluno, valorizar sua condição, o seu modo peculiar de ser. A pedagogia se aparelhava da psicologia. Despontava a visão dialética, holística do homem. O aluno passava a ser visto no seu todo, compreendido e ajudado nos aspectos cognitivo, afetivo e psicomotor. Nasceram daí os tais jargões educacionais, representativas da nova mentalidade: “o trabalho dignifica”, “liberdade com responsabilidade”, “educar é libertar”, “educar é um ato de amor” (tenho pavor dessa), “respeito às individualidades”, “só é mestre quem sabe aprender”...

A partir da década de 90 no lugar da rigidez, passou-se à flexibilização de atitudes e de conteúdo. O professor não mais impunha, ao aluno, seu planejamento ‒ agora elaborado de modo interdisciplinar ‒ ao contrário, planejava juntamente com o corpo docente e comunidade a sua colaboração, observando as tendências do ensino, respeitando o seu ritmo e sua potencialidade. O professor não mais era soberano e unânime, agora ele é um ser normal igual a todos nós que dialogava, construía o conhecimento juntamente com o aluno.

Percebe como a trajetória da humanidade atravessou um modelo ou foi abarcando as mudanças? Pois é, com o ensino foi a mesma coisa. À medida que a sociedade vinha mudando a escola também mudou e irá mudar seu modo de ensinar. E nesse processo todo o modo como à avaliação foi sendo construída ela precisou também passar por mudanças.

Imagem disponível em: https://youtu.be/YSWuwmecZ9k

Nesse vídeo o Professor Carlos Costa faz uma interessante definição, senão mais objetiva e compreensível análise, sobre as Tendências Pedagógicas que temos hoje (a partir de 14:37), daí é possível perceber o quanto a escola da década de 60 até os anos 2010 teve que se adequar aos novos parâmetros da sociedade.

Em resumo, hoje a escola foca no aprendizado do aluno. Na importância do resgate e da valorização dos saberes que ele tem e que irá adquirir com a vida na escola.

Voltando na questão da avaliação, o insucesso ou fracasso escolar não deve ser somente atribuído ao estudante. Pudemos observe até aqui que antes do séc. XVI o aluno era tido como Burro e Ignorante se não soubesse na ponta da língua todo conteúdo. Hoje esta prática, que se não abusiva de persuasão, não compete mais nos dias de hoje. Posso definir que no séc. XXI conseguimos lidar melhor, não plenamente, com a questão do insucesso ou fracasso em avaliações que no passado, pois hoje contamos com instrumentos que podem apontar isso e direcionar melhor um ensino mais analítico.

De acordo com (CHUEIRI apud CALDEIRA, 2000) “Avaliação escolar é um meio e não um fim em si mesma; está delimitada por uma determinada teoria e por uma determinada prática pedagógica. Ela não ocorre num vazio conceitual, mas esta dimensionada por um modelo teórico de sociedade, de homem, de educação e, consequentemente, de ensino e de aprendizagem, expresso na teoria e na prática pedagógica.”

A avaliação possui funções específicas como:
1) facilitar o diagnóstico;
2) melhorar a aprendizagem e o ensino (controle);
3) estabelecer situações individuais de aprendizagem;
4) interpretar os resultados;
5) promover, agrupar alunos (classificação).

O professor precisa ter em mente que avaliar significa emitir um juízo de valor sobre a realidade que se questiona, seja a propósito das exigências de uma ação que se projetou realiza sobre ela, seja a propósito das suas consequências.  Sendo assim exige critérios bem claros aos quais se define e que oriente em aspectos que realmente serão avaliados.

A avaliação é uma tarefa complexa que não se resume à realização de provinhas ou Ctrl+C e Ctrl+V e atribuições de notas. Avaliação é coisa séria e demanda atenção e não pode ter “pegadinhas”, questões com erros de português grosseiros, linguagem popular ou com tom de chacota. A avaliação precisa ser um instrumento sistematizado com padrão entre letras e informações, que abrange tudo o que foi ensinado naquele período, com perguntas mapeadas e que sigam um padrão estético e de coerência contextual. A prova segue uma espécie de mapa como se fosse um descritivo da aprendizagem do aluno. Em outras palavras a avaliação cumpre funções pedagógico-didáticas, de diagnóstico evitando o famoso “Ensina uma coisa e na hora da prova cai outra”.

Não é minha função aqui agora ensinar a como elaborar uma prova. Até mesmo porque eu tive que pagar pra aprender a como fazê-las, mas afirmo a você, caro leitor, que hoje eu não consigo fazer uma boa prova em menos de 3 dias. E é um processo cansativo e desgastante, mas faz parte do ofício.

Eu poderia fazer um livro só sobre a avaliação com seus métodos e processos, mas meu intuito aqui é evocar em você que a forma como fomos avaliados e a nossa experiência discente com avaliação não é a mesma e não compete mais no modelo do séc. XXI. Te obrigo a pensar que hoje o modelo de avaliação atual não mais abraça a reprovação com método punitivo. Em outras palavras, se convença; a reprovação não existe mais no modelo atual de ensino! Nunca se esqueça, a avaliação é inclusiva, enquanto a prova; é excludente e enaltece o fracasso.

MODELO DE AVALIAÇÃO DO SÉCULO XXI

A educação nasce com objetivos e funções relacionadas com o contexto histórico, político, social, econômico e científico. Nesse sentido, o professor no que tange as mudanças da sociedade e o modo de ensinar, precisa adaptar-se aos padrões da verdadeira avaliação em termos de utilidade, viabilidade, ética e precisão no século XXI, uma vez que o propósito de avaliar é promover o sucesso e transformação do aluno. Pode parecer lindo e poético, mas é necessário que abandonemos o pensamento de reprovação uma vez que o processo pedagógico hoje está totalmente voltado para a não reprovação.
Diante dessa tendência que apontam para a complexidade do sujeito do século 21, a avaliação deve considerar as demandas da vida atual: o enfrentamento de problemas, o relacionamento com o outro, o protagonismo juvenil, o mundo do trabalho em situações contextualizadas da vida real, as habilidades que o aluno possui, dentre outras. Sob essa perspectiva, o instrumento avaliativo deve ter características que promovam, de modo mais efetivo, a mensuração das capacidades do estudante em todos esses aspectos. A avaliação também precisa ser contextualizada e desafiadora para ele.

Apoiado na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) a avaliação deve contemplar 10 competências que gerais que articulam e mobilizam competências cognitivas, socioemocionais e princípios éticos, estéticos e políticos do aluno: 1) CONHECIMENTO, 2) PENSAMENTO CRÍTICO, CIENTÍFICO E CRIATIVO, 3) REPERTÓRIO CULTURAL, 4) COMUNICAÇÃO, 5) CULTURA DIGITAL, 6) TRABALHO E PROJETO DE VIDA, 7) ARGUMENTAÇÃO, 8) AUTOCONHECIMENTO E AUTOCUIDADO, 9) EMPATIA E COOPERAÇÃO e 10) RESPONSABILIDADE E CIDADANIA.

Essas são apenas concepções pedagógicas, o processo ele é trabalhado ao longo do ano e cada conteúdo tem seu enfoque e eixo temático ao qual pode ser incluído cada competência dessa. Óbvio que elas não devem entrar com itens em uma avaliação, mas serem analisadas num processo com vários outros instrumentos avaliativos que o professor puder utilizar. (Todas as competências na íntegra, disponível em: https://avaefape.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=3327&pageid=3605)

O ERRO É PURAMENTE HUMANO

Se você encarar de um ponto de vista amplamente didático, o erro é permitido e uma oportunidade. Claro que no mundo real da correção de 287 provas por bimestre o erro passa despercebido mesmo e só no final do ano quando o abençoado não alcançou os 60% necessários é que percebemos que o erro existe. Do ponto de vista construtivista, o erro é o momento de refletir e juntos buscar uma solução.

Pra você o erro e acerto são parte do processo de aquisição do conhecimento, ou o erro é algo a ser evitado e o acerto a ser perseguido como um fim em si mesmo?

Espero, iluminadamente, que você tenha respondido que errar é aprender também, se não; volte 8 casas...
Nós professores temos o momento do erro de duas formas... “O fulano não aprendeu” ... ou... “Sabia, esse depravado errou feio!” 

No mundo normal o erro assume uma posição de destaque, torna-se objeto de estudo, pois revela o caminho percorrido pelo estudante na busca por resultados assertivos. Adota-se, sob essa perspectiva, uma concepção de aprendizagem que põe em evidência a tentativa e o erro como aspectos intrínsecos à aprendizagem, procedimentos mentais dos quais os estudantes lançam mão na aquisição do conhecimento. Se a avaliação é um processo continuo ao longo daquele período, o erro deve ser encarado como meio de intervir! A famosa intervenção, aqui poder ser de duzentas mil formas! Uma conversa, um esclarecimento, talvez mesmo o famoso bloqueio intelectual que na hora o “cara” tem um branco e esquece tudo. Porque errar é humano e o aluno não é um PC que pode ser acessado o conteúdo a qualquer momento. Não se esqueça disso! Tire esse ódio do coração coleguinha, e dê oportunidades para que você possa ganhar um aliado e alguém possa ter confiança em você! #ficaAdica

Apoiado em (DIAS, 2019), a avaliação escolar deve está alicerçada pela tríade Ação-Reflexão-Ação, num acompanhamento permanente do professor que incitará o aluno a novas questões a partir de reflexão das respostas formuladas.

Diante deste quadro o professor também deve assumir um processo de ensino-aprendizagem mais eficaz diante do seu planejamento abandonando com os métodos arcaicos que não levam ao conhecimento ou a uma mera repetição de conteúdos.

Aí eu te pergunto, olha tamanha quanto é a responsabilidade de um professor em formar um cidadão e quais métodos ele precisa utilizar para fundamentar sua prática pedagógica com um salário desses?

Um Grande Abraço, Até o próximo Post 


REFERÊNCIAS:

CALDEIRA, Anna Salgueiro. Avaliação e processo de ensino-aprendizagem. 3. Ed. Belo Horizonte: Presença, 1997.

DIAS, Fernanda De Souza Barros. AVALIAÇÃO ESCOLAR. Disponível em: https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/avaliacao-escolar/12447

FIRME, Thereza Penna. OS AVANÇOS DA AVALIAÇÃO NO SÉCULO XXI. Disponível em: http://www.pe.senac.br/congresso/anais/2018/senac/pdf/artigos-palestrantes/OS%20AVAN%C3%87OS%20DA%20AVALIA%C3%87%C3%83O%20NO%20S%C3%89CULO%20XXI.pdf

GRISPINO, Izabel, Sadalla. RETROSPECTIVA HISTÓRICA: "A ESCOLA PÚBLICA NA DÉCADA DE 60". Disponível em: http://www.izabelsadallagrispino.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1344:retrospectiva-historica-a-escola-publica-na-decada-de-60&catid=103:artigos-educacionais&Itemid=456

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